Èdouard Manet | Passaporte para a Imortalidade
- Marisa Melo

- 20 de jul. de 2024
- 3 min de leitura
A Arte é o espelho da nossa alma. Dorian Gray e Fausto retratam sonhos: beleza, prazer, sabedoria... Oscar Wilde e Goethe souberam captar nosso íntimo, retratar suas épocas e entraram para a História. Esse é o poder da folha, da partitura e da tela em branco. Elas não esperam apenas mais um texto, mais uma canção, mais um quadro. Diante delas, um inglês escreveu “Ser ou não ser”. Um alemão combinou quatro notas mágicas em sua 5ª. Sinfonia. E um italiano pintou um sorriso enigmático. Passaram-se os séculos. E Shakespeare, Beethoven e da Vinci seguem vivos e reverenciados. Nenhum deles planejou isso. Mas ao traduzirem suas almas em suas obras, conquistaram um passaporte para a imortalidade. Quando essa entrega acontece, o observador é conquistado. E aplaude um estilo, que buscará avidamente no próximo quadro. Até criar uma intimidade que lhe permita em segundos relacionar a obra ao autor.
Vamos conversar sobre alguns artistas e seus estilos inconfundíveis.
Hoje conosco, Édouard Manet.

Édouard Manet nasceu em 23 de janeiro de 1832, em Paris, e morreu em 30 de abril de 1883, na mesma cidade. Filho de uma família burguesa, foi incentivado a seguir a carreira jurídica, mas desde cedo escolheu o caminho da pintura, estudando com Thomas Couture e frequentando o Louvre, onde copiava mestres renascentistas. Sua trajetória foi marcada por uma postura de ruptura: entre a tradição e a inovação, Manet abriu caminho para o modernismo e se tornou uma das figuras mais polêmicas e revolucionárias do século XIX.
Em 1863, apresentou “O Almoço na Relva” (Le Déjeuner sur l’herbe), recusado pelo Salon oficial e exibido no Salon des Refusés. A tela, que mostrava uma mulher nua entre homens vestidos em trajes contemporâneos, escandalizou o público. Não pela nudez em si, mas por confrontar os códigos da pintura acadêmica: o cenário moderno, a luz vibrante e a ausência de narrativa mitológica colocavam a nudez em contato direto com o presente. O impacto foi imediato: ali nascia a modernidade pictórica.
Poucos anos depois, em 1865, veio outro choque: “Olympia”, uma odalisca despida, deitada sobre lençóis brancos, que encarava o espectador com frieza e assertividade. O quadro, inspirado em Vênus renascentistas, expunha a mulher sem véus idealizadores, como corpo e presença direta. A crítica o considerou indecente, mas a história da arte o consagrou como marco de emancipação da pintura.
Manet não foi impressionista no sentido estrito, mas dialogou intensamente com o movimento. Sua paleta clara, as pinceladas soltas e o interesse por cenas urbanas o aproximaram de Monet, Renoir e Degas. No entanto, diferia deles pela insistência em manter vínculos com a tradição clássica. Sua pintura era um campo de tensão entre passado e presente, entre a herança dos mestres e o desejo de retratar o mundo em transformação.
Entre suas obras emblemáticas também está “Um Bar no Folies-Bergère” (1882), realizada no final da vida. A tela captura a modernidade parisiense, com a garçonete isolada diante de uma multidão refletida no espelho. O jogo de perspectivas e a ambiguidade da cena condensam a essência da modernidade: o indivíduo solitário em meio ao espetáculo da vida urbana.
A vida de Manet foi encurtada pela doença. Sofreu com problemas de saúde nos últimos anos e morreu aos 51 anos, em 1883, após complicações da sífilis, que o levaram à amputação de uma perna pouco antes de sua morte. Apesar da dor e da limitação física, continuou produzindo retratos, naturezas-mortas e cenas de flores até o fim, em busca de novas formas de expressão.
Édouard Manet conquistou seu passaporte para a imortalidade porque teve coragem de desafiar convenções, de colocar o presente no centro da tela, de revelar o cotidiano como tema digno da arte. Entre críticas e escândalos, afirmou a liberdade do olhar moderno. Sua obra permanece como ponte entre tradição e vanguarda, testemunho da arte que, ao refletir sua época, inaugura novos tempos. Diante de Olympia, do Almoço na Relva ou do Bar no Folies-Bergère, reconhecemos não apenas a audácia de um pintor, mas o nascimento da modernidade que continua a nos interpelar.






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