Georgina de Albuquerque | Passaporte para a Imortalidade
- Marisa Melo

- 28 de set. de 2022
- 3 min de leitura
Atualizado: 18 de set.
A Arte é o espelho da nossa alma. Dorian Gray e Fausto retratam sonhos: beleza, prazer, sabedoria... Oscar Wilde e Goethe souberam captar nosso íntimo, retratar suas épocas e entraram para a História. Esse é o poder da folha, da partitura e da tela em branco. Elas não esperam apenas mais um texto, mais uma canção, mais um quadro. Diante delas, um inglês escreveu “Ser ou não ser”. Um alemão combinou quatro notas mágicas em sua 5ª. Sinfonia. E um italiano pintou um sorriso enigmático. Passaram-se os séculos. E Shakespeare, Beethoven e da Vinci seguem vivos e reverenciados. Nenhum deles planejou isso. Mas ao traduzirem suas almas em suas obras, conquistaram um passaporte para a imortalidade. Quando essa entrega acontece, o observador é conquistado. E aplaude um estilo, que buscará avidamente no próximo quadro. Até criar uma intimidade que lhe permita em segundos relacionar a obra ao autor.
Vamos conversar sobre alguns artistas e seus estilos inconfundíveis.
Hoje conosco, Georgina de Albuquerque.

Poucos nomes na história da arte brasileira carregam o peso simbólico que Georgina de Albuquerque soube conquistar. Nascida em Taubaté em 1885, ela trilhou um caminho pioneiro em um cenário predominantemente masculino. Pintora impressionista, foi aluna de Eliseu Visconti e estudou em Paris na École des Beaux-Arts, trazendo para o Brasil não apenas a influência europeia, mas um olhar próprio, vibrante e moderno. Ao lado de seu marido, Lucílio de Albuquerque, construiu uma trajetória que se inscreveu nos salões oficiais e nas escolas de belas-artes, mas foi sua ousadia no tema e no gesto que a tornou singular.
Georgina não se limitou a registrar retratos ou cenas domésticas, como tantas mulheres artistas de sua época foram conduzidas a fazer. Seu feito mais célebre, a tela “Sessão do Conselho de Estado” (1922), marcou profundamente a iconografia nacional ao narrar um episódio histórico da Independência do Brasil. Ali, com pinceladas soltas e cores luminosas, colocou D. Leopoldina como protagonista política, em um tempo em que a história oficial relegava às mulheres papéis secundários. O quadro foi uma resposta contundente, não apenas ao cânone pictórico masculino, mas também ao lugar social destinado às mulheres.

Sua linguagem carrega a vibração impressionista: pinceladas rápidas, luminosidade em movimento, atmosferas que parecem respirar. Mas o impressionismo de Georgina não é apenas uma técnica, é um gesto de liberdade. Cada cor aplicada com leveza é também uma afirmação de que a pintura não precisa aprisionar, mas pode libertar. Entre lilases, verdes e ocres, sua paleta transforma cenas históricas e íntimas em espaços de revelação, onde a sensibilidade feminina se impõe como força estética e política.
A vida da artista foi também dedicada ao ensino. Como professora e diretora da Escola Nacional de Belas Artes, abriu portas e caminhos, formando gerações de artistas que encontraram nela um exemplo de consistência, disciplina e inovação. Sua prática pedagógica era tão marcante quanto sua obra: acreditava que a arte deveria ser vivida como experiência de emancipação, não apenas como reprodução de cânones.
Georgina de Albuquerque conquistou seu passaporte para a imortalidade ao mostrar que a pintura poderia ser, ao mesmo tempo, espaço de memória e de insurgência. Sua presença na história da arte brasileira não é apenas lembrada por ser uma mulher que ocupou lugares de destaque, mas porque transformou a tela em território de afirmação. Hoje, ao observarmos suas obras, não vemos apenas cores cintilantes: vemos o gesto de quem ousou inscrever uma narrativa feminina no coração da história oficial.

Obras de Georgina de Albuquerque




