Morrer é certo, o resto não
- Marisa Melo

- 11 de jul.
- 2 min de leitura
Atualizado: 18 de jul.

Viver é, no fundo, aceitar uma infâmia.
A gente nasce sem pedir, cresce sem entender, e morre sem avisar.
Ninguém sabe quando, nem onde, nem como.
Mas o fato é que vai acontecer.
E isso basta pra colocar tudo em suspensão.
Me impressiona como seguimos com tanta pressa,
fazendo planos como se o tempo fosse nosso.
Como se tivéssemos controle sobre alguma coisa.
Como se não soubéssemos que, em algum momento, tudo se desfaz, inclusive nós.
É quase cruel.
Você constrói uma vida, cria afetos, memoriza cheiros, hábitos, rotinas.
Acredita que tem tempo pra dizer, pra resolver, pra voltar.
E, de repente, não tem mais.
É como se a vida nos desse tudo e depois arrancasse sem explicação.
A morte é um contrato não lido.
A gente assina o nascimento com um prazo de validade invisível.
E vive como se fosse eterno, até que um dia não é.
Não sei se é trágico ou só cínico.
Alguns dizem que é por isso que a vida vale a pena:
justamente porque ela termina.
Mas eu não compro essa ideia tão fácil.
Há dias em que esse fim inevitável me parece uma piada sem graça.
Uma ironia que ninguém pediu.
Viver sob essa sentença silenciosa é exaustivo.
Exige um tipo de coragem que nem sempre se tem.
Você precisa amar sabendo que pode perder.
Fazer escolhas sabendo que o tempo é limitado.
Respirar fundo sabendo que, um dia, não vai mais respirar.
E, ainda assim, seguimos.
Fazendo listas, marcando compromissos, adiando conversas.
Como se fosse possível viver depois.
Como se o depois fosse garantido.
É por isso que, às vezes, me dá um nó.
Nascer pra morrer sem saber quando, isso é infame.
Mas talvez o que nos salva
é o fato de que, mesmo conscientes desse fim,
a gente insiste em viver.
E isso, por mais insano que seja,
é o que nos torna humanos.
Marisa Melo
"Escrevo para não desaparecer. Se algo em mim tocou algo em você, então já não estamos tão sós. " MM

