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Fernando Botero | Passaporte para a Imortalidade

  • Foto do escritor: Marisa Melo
    Marisa Melo
  • 10 de out. de 2024
  • 4 min de leitura

A Arte é o espelho da nossa alma. Dorian Gray e Fausto retratam sonhos: beleza, prazer, sabedoria... Oscar Wilde e Goethe souberam captar nosso íntimo, retratar suas épocas e entraram para a História. Esse é o poder da folha, da partitura e da tela em branco. Elas não esperam apenas mais um texto, mais uma canção, mais um quadro. Diante delas, um inglês escreveu “Ser ou não ser”. Um alemão combinou quatro notas mágicas em sua 5ª Sinfonia. E um italiano pintou um sorriso enigmático. Passaram-se os séculos. E Shakespeare, Beethoven e da Vinci seguem vivos e reverenciados. Nenhum deles planejou isso. Mas ao traduzirem suas almas em suas obras, conquistaram um passaporte para a imortalidade. Quando essa entrega acontece, o observador é conquistado. E aplaude um estilo, que buscará avidamente no próximo quadro. Até criar uma intimidade que lhe permita em segundos relacionar a obra ao autor.


Vamos conversar sobre alguns artistas e seus estilos inconfundíveis.


Hoje conosco, Fernando Botero.



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Trajetória e estilo


Fernando Botero nasceu em Medellín, Colômbia, em 1932, em uma cidade marcada pela desigualdade social, pela religiosidade intensa e pela força da cultura popular. Seu pai morreu cedo, e a infância foi atravessada por dificuldades materiais, mas também por estímulos que mais tarde emergiriam em sua pintura: procissões religiosas, touradas, festas populares. Antes de dedicar-se integralmente à arte, chegou a estudar para ser toureiro, experiência que abandonou mas que lhe deu sensibilidade para o espetáculo e para o gesto que reaparecem em suas obras.


Na juventude, frequentou a Escola de Belas Artes de Bogotá e logo começou a expor. O prêmio conquistado em um concurso nacional lhe permitiu viajar para a Espanha, onde estudou em Madri e mergulhou nos mestres do Prado, como Velázquez e Goya. Mais tarde, passou temporadas na Itália, aproximando-se do Renascimento, e também no México, onde os muralistas, especialmente Diego Rivera, o inspiraram pela monumentalidade e pelo vínculo com o povo. Esse itinerário de aprendizado moldou um artista cosmopolita que, sem abrir mão de suas raízes, construiu uma linguagem inconfundível.


Essa linguagem ficou conhecida como Boterismo: uma estilização das formas que lhes confere volume exagerado, corpos inflados, objetos transbordantes. Mas engana-se quem reduz esse estilo a caricatura. O que parece apenas humor esconde crítica. O excesso de peso é também peso simbólico: uma sátira à opulência, um comentário sobre o poder, uma ironia sobre os vícios sociais. Botero conseguiu criar um idioma visual que é imediatamente reconhecido em qualquer lugar do mundo, mas que mantém raízes profundas na cultura latino-americana.



Obras emblemáticas


A produção de Botero percorre a pintura e a escultura. Na pintura, suas naturezas-mortas são um universo à parte: frutas inchadas, garrafas monumentais, mesas que parecem prestes a ceder sob o peso da abundância. Nelas, a crítica social se mistura ao prazer estético, revelando a ironia com que o artista olhava para a vida cotidiana. Suas releituras de clássicos da pintura ocidental, a Mona Lisa arredondada, as versões infladas de obras renascentistas ou barrocas, funcionam como homenagens e provocações, lembrando que nenhum cânone é intocável.

Na escultura, Botero conquistou definitivamente o espaço público. Em Medellín, doou dezenas de peças monumentais que transformaram a cidade em um museu a céu aberto. Em Bogotá, Madri, Nova York e Paris, suas figuras volumosas em bronze, cavalos, mulheres, gatos, soldados, convivem com transeuntes e se tornaram parte do imaginário urbano. Poucos artistas do século XX conseguiram colocar sua obra tão perto da vida comum.


Entre suas séries mais impactantes está a dedicada ao escândalo da prisão de Abu Ghraib, revelado nos anos 2000. Nessas obras, Botero usou seu vocabulário característico para representar prisioneiros submetidos à tortura. O resultado é perturbador: corpos inflados e vulneráveis, transformados em monumentos do sofrimento humano. Ao dar escala monumental a vítimas anônimas, o artista inverteu a lógica da humilhação, devolvendo dignidade por meio da arte.

Além disso, Botero explorou temas religiosos e políticos. Padres, bispos, generais e presidentes surgem em suas telas com a mesma volumetria irônica, denunciando o excesso de poder e a hipocrisia institucional. Essa coerência temática reforça que seu estilo não era mero recurso formal, mas ferramenta crítica.




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Ao longo da vida, Botero enfrentou críticas de quem o acusava de repetição. Mas sua insistência em um mesmo vocabulário visual deve ser lida como fidelidade. Ele não buscava a variedade da novidade efêmera, mas a consistência de um universo próprio. Essa coerência fez dele um dos artistas latino-americanos mais reconhecidos do mundo, com presença em coleções e museus de todos os continentes.


Fernando Botero conquistou seu passaporte para a imortalidade porque transformou o excesso em metáfora. Suas figuras volumosas revelam a fragilidade, a vaidade, a opulência e a ternura humanas. Sua obra permanece porque fala tanto ao olhar popular quanto ao erudito, porque é simples de reconhecer e profunda de interpretar.


Ao caminhar diante de uma escultura sua em praça pública, ao ver uma tela em que a cor e a forma parecem transbordar do quadro, percebemos que o artista colombiano nos deu mais do que um estilo: nos deu uma maneira de ver o mundo em grande escala. Essa é a marca que garante a ele, sem dúvida, um lugar entre aqueles que transformaram sua visão pessoal em patrimônio universal.





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