MARISA MELO


Projeto Autoral
Visões Arcanas:
rostos que se moldam como vasos
carregam a essência da transição, marcando o limiar
entre o que é e o que ainda pode ser.
2020
A série Visões Arcanas nasceu como um sopro intuitivo, uma criação daquelas que surgem quase por necessidade, um chamado interno que pede forma, cor e matéria. Sempre trabalhei com pescoços alongados, em forma de vaso. Eles se tornaram, ao longo dos anos, uma assinatura, um traço que atravessa a produção como um fio condutor. São símbolos da transição, da passagem entre mundos, do limiar entre o que se firma e o que escapa.
A forma do vaso se impõe. Estruturas alongadas, delgadas, como se fossem corpos que guardam histórias em suas cavidades. Vasos são recipientes, e tudo o que contém algo também está sujeito ao vazio. Isso me toca profundamente. Há 30 anos, minha pesquisa gira em torno da impermanência, desse estar entre tempos, entre estados e, entre materialidades. E essa série reflete isso de uma maneira quase silenciosa, mas pungente.
Trabalhei com um mínimo de cores. O borgonha veio como um respiro quente, a sépia como terra antiga, o azul como memória líquida e o preto como a noite que tudo absorve. Poucas cores, mas com peso, densidade e presença. Cada pincelada foi uma conversa com esse equilíbrio entre contenção e expressão.
A transitoriedade é um tema que me acompanha porque me fascina e me desafia. Em Visões Arcanas , ela se manifesta na própria ideia do vaso como algo que pode conter e esvaziar, na estrutura alongada que parece querer se desfazer para alcançar algo além, na paleta enxuta que sugere tanto o essencial quanto o infinito. É uma série que fala sobre permanência e fuga, sobre guardar e deixar ir.
E, no fim, é isso que me move: essa dança entre o efêmero e o eterno.